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Duas décadas depois, servidores do Estado do Rio voltam a ser atormentados por crise

Em 2016, servidores lotam ruas da cidade protestando contra o parcelamento dos salários

Parcelamento do 13º salário de 2015, calendário irregular de pagamentos em 2016, promessa de redução de cargos e revisão de contratos para conter a crise. Duas décadas depois, o Estado do Rio vive um novo caos financeiro, o que tem atormentado os servidores, gerando preocupação sobre o futuro do funcionalismo. Entre 1995 e 1998, na administração Marcello Alencar, o governo estadual lidou com problemas diferentes dos atuais, mas as medidas adotadas à época chamam a atenção pela semelhança em relação à receita atual para o ajuste das contas: cortes no quadro de funcionários e aposta em vendas de empresas ao setor privado.

— O Rio teve que enfrentar o início do Plano Real e uma inflação de 30%. Tivemos que adotar um plano de privatização de empresas para enxugar gastos — recorda-se Luiz Paulo Corrêa da Rocha, vice-governador de Marcello Alencar à época, hoje deputado estadual (PSDB).

Não foram apenas as privatizações de ativos, como a Companhia Estadual de Gás (CEG) e a Companhia de Eletricidade do Estado do Rio de Janeiro (Cerj), que ajudaram o governo estadual a sair do atoleiro. Houve também diminuições de cargos comissionados e gratificações. Em 1995, bonificações foram cortadas.

— Adotamos, em 1996, um plano de demissão voluntária. Ao menos nove mil servidores deixaram o funcionalismo — lembrou Augusto Werneck, secretário de Administração naquele período.

O programa de exonerações incentivadas foi aprovado em 1996 e ofereceu a alternativa a servidores do Executivo, do Judiciário e do Legislativo. Segundo Werneck, as ofertas foram diferentes, de acordo com as categorias. As rescisões foram pagas com a ajuda da União, por meio de um empréstimo. Nos quatro anos de governo de Marcello Alencar, os pagamentos do 13º salário atrasaram em 1995 e 1996. Segundo a administração da época (de acordo com reportagens antigas), o número de funcionários chegava a 350 mil, e a folha mensal não passava de R$ 500 milhões.

Sobre a crise atual, o governo do Rio justifica que a queda do preço do petróleo no mundo e a retração da atividade econômica estadual não sustentaram o crescimento da folha de pagamento, principalmente do que é pago a aposentados e pensionistas. Hoje, são mais de 460 mil servidores entre ativos, inativos e pensionistas. Com isso, o Tesouro Estadual tem que bancar R$ 2 bilhões por mês em pagamentos de salários.

— Alternativas precisam ser adotadas já. Cortar cargos não adianta. Tem que elevar a arrecadação ou negociar ativos. A venda da Dívida Ativa e a reavaliação dos royalties são importantes — disse Luiz Paulo.

Com um espaço de tempo de 20 anos, o resultado das duas últimas crises do Estado do Rio é o mesmo: mudanças na vida dos trabalhadores.

‘Ameaça de ficar sem pagamento é real’

Entre os servidores que acompanharam de perto a crise da década de 90, os problemas atuais representam ameaças maiores ao funcionalismo. O medo de sofrer com o não pagamento de salários e as demissões é crescente.

— O servidor, hoje, tem noção de que, após a realização da Olimpíada, nós sofreremos com o auge da crise. A ameaça de ficar sem pagamento em um ou dois meses é real. Do 13º salário nem se fala mais. Vai piorar — disse Jorge Darze, hoje presidente do Sindicato dos Médicos (SinMed-RJ), que foi integrante da entidade nos anos 90.

Para o professor aposentado Alcebíades Teixiera, o processo de privatização adotado pelo governo estadual naquela década — influenciado pela União — tornou o ambiente favorável ao crescimento. Atualmente, as saídas estão no horizonte.

— Naquela época, não faltava dinheiro. Não diria que vivemos uma crise, pois o país convivia com uma nova política de incentivos privados. Hoje, não se tem essa possibilidade. Dinheiro há sempre, mas outros interesses estão à frente do que é melhor para os trabalhadores — disse Alcebíades, que participou do movimento sindical da Educação na década de 90.

Hoje procurador do Estado do Rio, o ex-secretário de Administração Augusto Werneck defende que o gasto com a folha de pagamento seja revisto o quanto antes:

— O Estado não é viável com o peso que tem em relação a aposentadorias e pensões. O gasto, hoje, é superior a R$ 1 bilhão. Isso precisa ser revisto para que se consiga governar.

Na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), é consenso que o governo ainda não adotou as medidas necessárias para estancar a crise. No início de junho, o governador em exercício, Francisco Dornelles, anunciou uma reforma administrativa que extinguiu cinco secretarias e sugeriu a revisão de contratos e a venda de ativos, ações consideradas insuficientes.

As apostas do governo para aumentar o caixa são a venda da Dívida Ativa e a revisão de pendências com a União.

José Lisboa G. Malcher

Ex-presidente do Tribunal de Justiça do Rio (1995-1997)

“No período em que estive à frente do Tribunal de Justiça do Rio, tivemos dificuldade para trabalhar por falta de repasses. Os valores do Orçamento devidos ao Judiciário sempre foram liberados com atraso. Eu era amigo do Marcello (Alencar), mas ele sempre atrasava o repasse. Eu tinha que falar com ele com a folha de arrecadação mensal do Estado nas mãos, para mostrar que tinha recursos. Naquela época, havia dinheiro, como tem agora. Tenho a opinião de que vivemos a mesma situação. O que falta é organização”.

Fonte: jornal Extra Online
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